Braga Netto é considerado um dos ministros mais próximos de Bolsonaro
O presidente Jair Bolsonaro (PL) disse que já escolheu seu vice na candidatura à reeleição e, apesar de ter afirmado que não adiantaria o nome, deu pistas que apontam para o general de Exército Walter Souza Braga Netto, seu atual ministro da Defesa.
Bolsonaro disse que a reforma ministerial prevista para 31 de março deixará claro seu vice. Para formar uma chapa com Bolsonaro, Braga Netto, que é apontado como um dos ministros mais próximos do presidente, teria que sair do governo.
Caso se confirme, a troca será de um general por outro: o atual vice é Hamilton Mourão, também general de Exército, que deixou a ativa em 2018, filiou-se ao PRTB para concorrer na chapa de Bolsonaro e atualmente é filiado ao Republicanos.
A lei eleitoral exige que ministros de Estado que disputarão a eleição para a Presidência ou Vice-presidência deixem o cargo seis meses antes do primeiro turno, ou seja, até 2 de abril.
O presidente afirmou ainda que quer um vice “que não tenha ambições de assumir” seu lugar em um eventual próximo mandato. “Eu posso adiantar para vocês, hoje em dia o vice é de Minas Gerais”, declarou.
“Obviamente, vocês vão tomar conhecimento de quem vai ser meu vice, apesar de (a definição) só ser em agosto, pelas possíveis saídas de ministro agora dia 31 de março. Não quero adiantar agora o nome dele, o Salles talvez saiba, pode sugerir ou tentar adivinhar”, afirmou o presidente.
O presidente se referia ao ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, presente à entrevista. Salles saiu em defesa de Braga Netto.
“Dou meu palpite, aliás, não é só o meu palpite, é o meu desejo, que o nosso colega Braga Netto, um grande general, um homem leal ao senhor, competente, sério, e acima de tudo muito discreto e eficiente. Espero que seja ele o mineiro a que o senhor está se referindo”.
Ao ser questionado diretamente se o general é seu escolhido, Bolsonaro respondeu: “Vou dar mais uma dica: é nascido em Belo Horizonte. Mais uma dica: fez colégio militar”. Braga Netto é de Belo Horizonte.
Trajetória no Exército
Braga Netto entrou para o Exército em 1975 e atuou no Rio durante grande parte da sua carreira. Foi promovido a general em 2009 e nomeado chefe do Estado-Maior do Comando Militar do Oeste no mesmo ano.
Colegas de Braga Netto definem o novo ministro como respeitado pela tropa, “durão” e experiente. O general é visto entre seus pares como um nome de “forte liderança” e “bem articulado”. Parte da articulação pode ser atribuída aos “estágios” na área diplomática feitos pelo militar.
Quando ainda era coronel, Braga Netto ocupou o cargo de adido militar do Brasil na Polônia, entre os anos de 2005 e 2006. Depois, foi promovido a general de divisão ainda no governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em novembro de 2009.
Em 2012, passou a ocupar a aditância militar nos Estados Unidos e Canadá — enquanto exercia o cargo em Washington, foi promovido a general de Exército. Pouco depois da promoção, em 2013, foi exonerado para, em maio, assumir a função de diretor de Educação Superior Militar, no Rio de Janeiro.
No mesmo ano, por decreto assinado pela então presidente Dilma Rousseff, o general recebeu o grau de Grande-Oficial da Ordem do Mérito Militar. Ainda no Rio, Braga Netto foi o responsável pela segurança dos Jogos Olímpicos de 2016, antes de ser nomeado para assumir o Comando Militar do Leste.
Em 2018, Braga Netto comandou a intervenção federal do governo Michel Temer na segurança pública do Rio de Janeiro e passou a controlar a Polícia Civil, a Polícia Militar, os bombeiros e administração penitenciária do Estado.
Nos pouco mais de dez meses em que o general comandou a segurança pública fluminense, o Estado registrou queda de roubos e aumento das mortes provocadas pela polícia. A intervenção acabou em 31 de dezembro de 2018.
“Fizemos uma choque de gestão muito baseado na meritrocracia. Eu praticamente não aceitei pedidos políticos. Se a pessoa tinha mérito, eu colocava no cargo. Se não tinha mérito, eu não colocava no cargo”, disse o general em janeiro de 2019, em entrevista à TV Aparecida, sobre seu período no comando da intervenção.
Na ocasião, o general argumentou que houve aumento do “número de pessoas mortas em confronto com a polícia” porque criminosos reagiam às operações policiais, em vez de se entregar.
“Não é que nós demos autorização para matar, nada disso, simplesmente foi a metodologia empregada. Nós passamos a realizar os patrulhamentos em cima das manchas criminais. Um exemplo: eu sabia muito bem que quarta-feira, (às) tantas horas, aumentava o número de roubo de carro, ou roubo de carga, em determinado lugar, havia essa mancha (de crimes recorrentes). Aí você fazia uma operação conjunta (das polícias estaduais e Forças Armadas)”, disse ao canal católico.
“O que ocorre é que o bandido no Rio tinha uma política de enfrentamento irracional. Ele estava às vezes cercado, com armamento pesado, e buscava o confronto. Mas a tropa estava adestrada e tinha muita tropa no local, Polícia Militar, Polícia Civil, o que fosse. Nessa postura irracional do bandido, se ele não se entregava, ele acabava morrendo. Essa (categoria de morte) aí realmente aumentou”, completou.
Na avaliação do Observatório da Intervenção, iniciativa do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania da Universidade Candido Mendes (CESeC/Ucam), a atuação das Forças Armadas não trouxe melhorias estruturais para a segurança pública do Rio.
“Durante esses dez meses de 2018, não foram feitos investimentos significativos no combate aos grupos de milícias e à corrupção policial. A modernização da gestão das polícias também não foi priorizada — a renovação se restringiu à compra de equipamentos”, destaca relatório do Observatório ao final da intervenção.
“Ao mesmo tempo, práticas violentas da polícia fluminense continuaram e se agravaram. Em vez de modernizar, reformar ou mudar, a intervenção levou ao extremo políticas que o Rio de Janeiro já conhecia: a abordagem dos problemas de violência e criminalidade a partir de uma lógica de guerra, baseada no uso de tropas de combate, ocupações de favelas e grandes operações”, diz ainda o documento.
Governo Bolsonaro
Braga Netto entrou para o governo em fevereiro de 2020, quando foi anunciado como novo ministro chefe da Casa Civil, no lugar de Onyx Lorenzoni. A troca deu mais poder à ala militar do governo, grupo que havia perdido espaço para a ala mais ideológica ao longo de 2019.
Um oficial que serve no Rio descreveu Braga Netto à BBC News Brasil como um militar rígido, mas que não compartilha o pensamento “linha dura” de outros generais como Sérgio Etchegoyen, que chefiou o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência durante o governo Temer, ou Carlos Alberto dos Santos Cruz, que foi ministro de Bolsonaro até junho e hoje é rompido com o presidente.
Lorenzoni, que está afastado do seu mandato deputado federal (DEM-RS), continuou na Esplanada dos Ministérios, assumindo o comando da pasta da Cidadania, no lugar de Osmar Terra, também deputado gaúcho, mas pelo MDB.
Tradicionalmente, a Casa Civil é um dos ministérios mais importantes, atuando na coordenação das demais pastas e na articulação com o Congresso Nacional. No entanto, o órgão vinha sendo esvaziado no governo Bolsonaro desde junho, quando a responsabilidade pela negociação política foi transferida para a Secretaria de Governo, comanda então ministro general Luiz Eduardo Ramos, e a coordenação do PPI (Programa de Parcerias e Investimentos), responsável por impulsionar obras de infraestrutura por meio de concessões à iniciativa privada, ficou nas mãos do ministro da Economia, Paulo Guedes.
O esvaziamento da pasta deixou evidente o enfraquecimento de Lorenzoni, que no início era homem forte do governo, tendo inclusive chefiado a equipe que coordenou a transição entre a administração Temer e a gestão Bolsonaro, devido ao desempenho considerado ruim na articulação política com o Congresso.
Já Osmar Terra também sofreu desgaste depois que reportagens recentes do jornal O Estado de S. Paulo revelaram que o Ministério da Cidadania, sob seu comando, contratou serviços da empresa de tecnologia Business Technology (B2T), que é investigada pela Polícia Federal por supostos contratos fraudulentos com o governo federal entre 2016 e 2018, quando Temer (MDB) era presidente.
À frente da Casa Civil, Braga Netto se tornou um dos ministros mais próximos de Bolsonaro. Ele deixou a pasta para assumir a Defesa após a demissão do ocupante do cargo até então, o general Fernando Azevedo e Silva, em março de 2021 – que foi seguida pela saída dos três comandantes das Forças Armadas em protesto.
Logo depois, ele assinou uma “ordem alusiva ao 31 de março de 1964” em que diz que acontecimentos como o golpe militar ocorrido há 57 anos, o qual chamou de “movimento”, devem ser “compreendidos e celebrados”.
O relatório da CPI da Covid, que apurou as ações e omissões do governo da pandemia, pediu em outubro passado o indiciamento do general por sua atuação como ministro e coordenador coordenador do Centro de Coordenação das Operações do Comitê de Crise da Covid-19, criado pelo Planalto para facilitar a articulação de ações de combate à doença entre órgãos públicos.
O documento aponta que os altos números de casos e mortes por covid-19 no Brasil foram em parte causados por erros do governo sobre os quais o general teria responsabilidade. O relatório afirma ainda que o ministro foi conivente com a “postura negacionista” de Bolsonaro sobre a pandemia.
Braga Netto disse que seu indiciamento é “um grande equívoco” e que teria documentos para provar isso.
*Com reportagem de Mariana Shreiber, da BBC News em Brasília.