Planalto e parlamentares chegam a consenso de que o benefício tem de ser retomado, mas o valor da ajuda e a fonte de financiamento seguem indefinidos. Corte de gastos e até mesmo a criação de imposto estão entre as possibilidades.
Diante do recrudescimento da pandemia da covid-19 e a lentidão do processo de vacinação conduzido pelo governo federal, economistas iniciaram a onda de revisões para baixo do desempenho da atividade econômica neste ano. Não à toa, o presidente Jair Bolsonaro e o Centrão já estão alinhados sobre a volta do auxílio emergencial como forma de ajudar na retomada da economia e na popularidade do governo.
Os novos presidentes do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já sinalizaram. São favoráveis ao retorno do benefício para os mais vulneráveis que não foram contemplados pelo Bolsa Família. No ano passado, o auxílio ajudou a evitar um tombo maior no Produto Interno Bruto (PIB) e, de quebra, elevou a aprovação de Bolsonaro, principalmente, no Nordeste. Contudo, o tamanho do auxílio e a fonte de financiamento continuam indefinidos, apesar da urgência da matéria, que estará na pauta dos parlamentares integrantes da Comissão Mista do Orçamento (CMO), a ser instalada hoje.
Apesar do consenso sobre a necessidade do auxílio, não há o mesmo entendimento a respeito do financiamento do benefício. Líder do DEM na Câmara, Efraim Filho (PB) reconheceu que o auxílio deve dominar os debates no Congresso e informou que será preciso buscar espaço para ele no Orçamento, “durante os trâmites na CMO, via corte de despesa”.
O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) defendeu o corte de gastos para a inclusão do auxílio emergencial no Orçamento e descartou aumento de impostos para bancar o benefício. O líder do Podemos na Câmara, Léo Moraes (RO), também confirmou o consenso sobre a necessidade de aprovação da ajuda no Congresso. Segundo ele, com a vacina, o programa “vai aquecer a economia”.
De acordo com o líder do DEM no Senado, Marcos Rogério (RO), existe disposição do governo e de parlamentares para aprovar um novo socorro aos mais vulneráveis, mas não nos mesmos moldes do auxílio do ano passado e sem impor condicionantes para o acesso. “O governo vai ter de achar o caminho para estender o benefício, como fazer isso sem que represente um aumento no rombo das contas públicas. A prioridade é quem está passando necessidade. A questão orçamentária, fiscal, é meta de todos. Mas, primeiro, você alimenta quem tem fome”, ressaltou.
No Planalto e no Congresso, apesar do discurso do ministro da Economia, Paulo Guedes, de que é preciso recriar o auxílio “com responsabilidade fiscal”, não está totalmente descartada a criação de um imposto para custear o socorro. Essa medida, no entanto, não ajudaria o governo a cumprir a regra do teto de gastos, que limita o aumento de despesas à inflação do ano anterior. Guedes defende a volta da CPMF. Para economistas, essa medida “de ajuste fiscal preguiçoso” seria um tiro no pé para o Executivo e para a retomada da economia.
Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, não descarta a possibilidade de o governo tentar emplacar um novo imposto. A medida deve seduzir boa parte do Centrão. “De novo, fica claro que muitas pautas acontecem sem o dedo do Guedes para reforçar que o problema não era tanto o Rodrigo Maia”, afirmou, numa referência ao ex-presidente da Câmara. “Com o Centrão, é mais provável um ajuste via impostos do que corte de gastos. É o que deveremos ver nos próximos dois anos. O difícil será conceber um presidente que falou tanto para a sua base contra aumento de impostos”, acrescentou Vale, que revisou de 0,1% para 0,8% a previsão de queda do PIB no primeiro trimestre e não descarta recessão nos seis primeiros meses.
“Aumentar impostos não resolve o teto, ainda que ajude no primário. Não parece um caminho promissor para os problemas de curtíssimo prazo. Será preciso medida compensatória do lado da despesa, para respeitar o teto (para abrigar o auxílio)”, avaliou Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI). “Outra possibilidade para o auxílio é o chamado crédito extraordinário. Nesse caso, é bom lembrar que despesas maiores afetam o deficit e a dívida. O importante é não perder de vista a responsabilidade fiscal.”
Descontentamento
Vários indicadores do mercado financeiro refletiram, ontem, descontentamento com a provável volta do auxílio emergencial sem que o governo tenha uma definição clara sobre as fontes de recursos para bancá-lo. O dólar e o risco-país subiram, após Bolsonaro confirmar que pretende prorrogar o auxílio. O Banco Central acabou realizando uma intervenção, com oferta de US$ 1 bilhão em contratos de swap cambial, mas não conseguiu evitar a desvalorização do real.
O presidente do BC, Roberto Campos Neto, reforçou não haver espaço no Orçamento para o auxílio sem uma contrapartida, como cortes de despesas, e alertou para a alta dos juros. “A reação dos mercados nos mostra que a fragilidade fiscal pesa mais do que os eventuais benefícios de se colocar mais dinheiro na economia. Pode acabar tendo o efeito contrário, de contração da economia”, disse, em um evento a investidores estrangeiros.
O economista Matheus Rosa, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), lembrou que o debate tem convergido para uma aprovação de um novo auxílio emergencial por fora do teto, por meio dos créditos extraordinários, “mas não é consensual de que isso é viável juridicamente”. Segundo ele, os riscos continuam sendo um desvio do caminho para a sustentabilidade fiscal no longo prazo e aumento de juros e desvalorização do real. “Para isso, espera-se o avanço da agenda de reformas que engessou no segundo semestre de 2020”, emendou. (Colaborou Vera Batista)Fonte:correiobraziliense