Os vídeos com pedidos de votos para os então candidatos Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva foram pagos por usuários do TikTok em Portugal
Anúncios políticos no TikTok voltados para eleitores brasileiros em Portugal circularam durante a campanha eleitoral de 2022.
Os vídeos com pedidos de votos para os então candidatos Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva foram pagos por usuários do TikTok em Portugal, e não pelos partidos ou pelos candidatos, o que fere a legislação eleitoral.
Além disso, o TikTok, em seus termos de uso, afirma que não aceita anúncios políticos.
Segundo levantamento preliminar do NetLab da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a partir da biblioteca de anúncios do TikTok, que acaba de ser lançada na União Europeia, os anúncios circularam no TikTok de 4 de outubro a 1º de novembro de 2022.
Eram vídeos pedindo votos para Lula ou Bolsonaro, exaltando as qualidades do candidato e criticando o opositor.
Os termos de uso do TikTok proíbem a veiculação de anúncios de conteúdo político.
“Compartilhar visões políticas e se envolver na discussão política é permitido se for conteúdo orgânico, mas não pode ser usado em anúncios pagos”, dizem os termos de uso da empresa. “Conteúdo político não é permitido em nenhum tipo de publicidade.”
Os anúncios eram direcionados a usuários do TikTok em Portugal. No ano passado, 80,9 mil brasileiros estavam aptos a votar lá na eleição presidencial brasileira de 2022 –havia 239,7 mil brasileiros morando oficialmente naquele país.
Segundo a Lei das Eleições, “é vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, excetuado o impulsionamento de conteúdos, desde que identificado de forma inequívoca como tal e contratado exclusivamente por partidos, coligações e candidatos e seus representantes.”
Para Fernando Neisser, presidente da Comissão de Direito Eleitoral do Instituto dos Advogados de São Paulo, o fato de a propaganda ter sido veiculada em Portugal não exime a empresa de responsabilidade.
“Pouco importa o local onde é feita a contratação ou em qual área territorial se distribuiu certa publicidade – o intuito óbvio só pode ser afetar eleitores brasileiros residentes em Portugal, que votam (em eleições brasileiras) em Portugal; os anunciantes e o público-alvo continuam vinculados às leis brasileiras”, diz.
Segundo ele, afirmar que não há jurisdição da Justiça brasileira seria o mesmo que dizer: eu posso comprar votos de eleitores brasileiros que moram em Portugal ou nos Estados Unidos, posso coagir à mão armada eleitores brasileiros que moram nesses países, porque a lei brasileira não se aplica.
“Não há permissão tácita de se autorizar uma publicidade irregular, paga por terceiros, feita fora das vias previstas na lei pelo mero fato de estar sendo veiculada em outro país.”
Outra possível irregularidade é que os anúncios configuram gastos de campanha, feitos por terceiros, e não declarados ao Tribunal Superior Eleitoral, como determina a legislação.
Procurado, o TikTok não enviou posicionamento até o fechamento da reportagem.
Segundo Marie Santini, diretora do NetLab, é muito importante que todas as plataformas tenham as chamadas bibliotecas de anúncios, para que se possa verificar se as regras eleitorais estão sendo cumpridas. No Brasil, o TikTok não tem.
“A transparência nos anúncios é essencial, porque só assim conseguimos fiscalizar as campanhas eleitorais; as bibliotecas mostram que muitos anúncios acabam passando pelos filtros das plataformas”, diz.